Mateus Marcel Netzel*
Fracassos nas negociações do acordo de redução das emissões de gases estufa nas duas últimas Conferências das Partes – COP 15 e 16 – levaram ao desenvolvimento de uma série de estudos financiados pela iniciativa privada sobre os impactos da aplicação de técnicas de geoengenharia.
"A proposta dessas técnicas é evitar um aquecimento de 5 a 6 graus centígrados na temperatura média global, que destruiria a maior parte dos ecossistemas terrestres e teria implicações refletidas nos próximos 10 mil anos", explica Paulo Artaxo, membro do IPCC – Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas – órgão estabelecido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente para fornecer informações científicas e técnicas relevantes para entender as mudanças climáticas globais.
Uma das formas pensadas para a injeção de aerossóis na estratosfera, o que ajudaria a refletir a radiação solar.
A ideia da geoengenharia é neutralizar o aquecimento global através de mecanismos artificiais de controle da incidência de radiação solar sobre a superfície terrestre e de sequestro do CO2 atmosférico, retido por plantas, terrestres e aquáticas, e em formações geológicas profundas. Porém cada um dos mecanismos possui pontos fracos bastante relevantes: bloquear a luz solar seria eficiente para resfriar o planeta, mas não resolveria os problemas colaterais da alta concentração de gases estufa na atmosfera, como a acidificação dos oceanos. Já a retenção do carbono esbarra na inviabilidade econômica, no caso dos reservatórios geológicos, e no atentado à biodiversidade provocado por algumas das técnicas propostas, como a fertilização dos oceanos.
Projetos de embarcações que injetariam vapor d’água na estratosfera.
Os impactos são extensos, atuando principalmente sobre o ciclo hidrológico, no balanço de radiação e no índice de absorção de carbono pelas grandes florestas. No entanto, a ciência ainda não é capaz de prever com exatidão o tamanho dos efeitos da aplicação dessas técnicas. O sistema climático global é composto por um quadro muito grande de fatores conectados entre si e, segundo Artaxo, a ciência conhece muito pouco de cada um desses processos para poder compreender o clima global como um todo. Justamente por essa interdependência de fatores, as técnicas de geoengenharia podem provocar uma série de eventos catastróficos à natureza. “Cada uma dessas estratégias tem efeitos colaterais extremamente graves e importantes. Em algumas, o remédio é mais perigoso que a própria doença", explica o pesquisador.
O Brasil nesse cenário seria um dos países mais afetados. Um estudo realizado no Laboratório Nacional Lawrence Livermore (EUA), conduzido pelo cientista especializado em mudanças climáticas Govindasamy Bala, indicou que a diminuição na incidência de raios solares resultaria num ciclo hidrológico menos intenso. Essa mudança afetaria diretamente zonas tropicais, como a Amazônia e o cerrado, provocando secas que destruiriam boa parte da biodiversidade local.
Além de ser incapaz de precisar o impacto da sua aplicação, a geoengenharia é bastante questionada por seu caráter global. Uma vez que seus efeitos não podem ser restringidos a locais específicos, a decisão de implantação das técnicas precisaria decorrer de um consenso mundial e certamente provocaria conflitos entre as grandes nações do mundo. Outro aspecto que causa o temor dos especialistas é a necessidade de manutenção ininterrupta dos mecanismos adotados, já que qualquer paralisação provocaria um aumento abrupto de temperatura, muito mais desastroso para os ecossistemas do que o aquecimento gradual.
Vários estudos estão sendo desenvolvidos no intuito de esclarecer as consequências de uma mudança climática artificial de âmbito global. Entretanto, os especialistas concordam em afirmar que ainda é muito cedo para assegurar a eficácia dos métodos de geoengenharia e garantir que seus efeitos sejam controlados e não provoquem desastres ambientais. “Por enquanto, nós não temos outra alternativa senão reduzir fortemente as emissões de gases estufa”, conclui Paulo Artaxo.
*Mateus Marcel Netzel é estudante de jornalismo e participa do projeto Repórter do Futuro, do Instituto Oboré.
Fonte:
http://www.oeco.com.br/reportagens/25111-geoengenharia-projeta-solucoes-arriscadas-para-clima
Tecnologia | Vantagens | Desvantagens |
Injeção de aerossóis na estratosfera | Aumento da absorção de radiação solar antes da superfície terrestre | Aumento da concentração de gases estufa |
Espelhos refletores na órbita terrestre | Diminuição da incidência da radiação solar sobre a superfície terrestre | Alto custo e não interfere na quantidade de gases estufa |
Injeção de vapor d’água na estratosfera | Aumento da quantidade de nuvens e diminuição da incidência de radiação solar sobre a superfície terrestre | Desequilíbrio do ciclo hidrológio global |
Retenção de CO2 em reservas geológicas profundas | Diminuição da concentração de gases estufa na atmosfera | Alto custo e tecnologia em desenvolvimento |
Fertilização dos oceanos | Aumento do número de algas e da absorção de carbono | Destruição da biodiversidade e dos ecossistemas marinhos |
Reflorestamento de grandes áreas | Aumento na absorção do carbono atmosférico | Ocupação de terras agricultáveis |
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