Há cerca de duas semanas, mais de 40 cientistas partiram em uma missão inusitada. A bordo de duas embarcações, eles viajarão mais de 900 km em altomar até encontrarem o que foi batizado como a`ilha de lixo'.
Trata-se de uma imensa área, com dimensões semelhantes a três vezes o tamanho do Estado de São Paulo, localizada no norte do Oceano Pacífico, entre o litoral da Califórnia (EUA) e do Japão. Lá, correntes marinhas que formam uma espécie de redemoinho foram concentrando, ao longo dos anos, toneladas de detritos plásticos.
A descoberta desse imenso depósito flutuante ocorreu há 12 anos, por puro acaso, já que o local está em águas internacionais, de baixa circulação de navios. Hoje, acredita-se que sua formação se deve, basicamente, ao descarte incorreto do lixo doméstico (80%) de países asiáticos e da América do Norte.
ALTERNATIVAS
O objetivo dos pesquisadores é dimensionar essa área e avaliar detalhadamente seus componentes a maioria composta por minúsculos fragmentos que foram se decompondo mediante a ação do sol e da água do mar.
O grande problema, porém, é o que fazer com esses resíduos. Fruto de processos produtivos inadequados, aliado a um consumo desenfreado e à incapacidade dos governos de implantar sistemas eficientes de coleta seletiva e de educação ambiental, fenômenos como a `ilha de lixo' tendem a aumentar o que não quer dizer que existam alternativas.
Um exemplo é a empresa paulista Couroecol, produtora de artigos em couro. Para se ter uma ideia do impacto desse segmento no meio ambiente, em Franca(SP), o maior polo calçadista do País, cerca de 100 toneladas de retalhos são gerados todos os dias, contendo 17 diferentes tipos de poluentes químicos usados no processamento do couro cru.
Para evitar o descarte puro e simples do material, a empresa criou um método que consiste no trituramento desse lixo, que se transforma em matéria-prima na fabricação de blocos para construção civil. Adotado em larga escala, pode se tornar uma opção interessante aos construtores, pois os blocos com resíduo de couro apresentam melhor isolamento térmico do que os convencionais, garante Emar Garcia Junior, dono da Couro e col.
ELETROELETRÔNICOS
Além do vestuário, outro segmento que gera grande quantidade de resíduos é o eletroeletrônico. O número de carcaças de computadores e de televisores é tão grande que muitos países simplesmente exportam esse lixo para depósitos em nações pobres. Lá, os componentes são queimados visando a retirada de metais preciosos. O restante acaba descartado em lixões daí para rios e desses para o mar.
Agora, pesquisadores da Universidade de Iorque, na Inglaterra, criaram um método que permite reaproveitar as telas de LCD, usadas em monitores de computador, tevês e celulares.
O inédito processo permite que esses componentes se transformem não apenasem novas telas LCD, como também em compostos úteis na medicina, como próteses ou nas chamadas `drogas inteligentes', capazes de chegar ao local preciso onde o medicamento deve ser aplicado, evitando efeitos colaterais danosos.
São dois exemplos, entre muitos outros, seja no Brasil ou no exterior, que buscam a utilização racional dos resíduos. Sozinhos, não irão evitar futuras`ilhas de lixo', mas demonstram que é possível buscar um novo padrão de desenvolvimento que, aliado à educação ambiental, se traduzem em qualidadede vida.
Segunda-Feira, 17 de Agosto de 2009, 09:14
Proposta é transformar plástico em combustível
Da Redação
A `ilha de lixo' do Oceano Pacífico foi descoberta em 1997 pelo oceanógrafo
norteamericano Charles Moore, durante uma competição de barcos à vela entre Los Angeles e o Havaí. No final de julho, ele e um grupo de cientistas partiram em uma expedição ao local, batizada de Projeto Kaisei, nome de um dos dois barcos que compõem a jornada.
Uma das propostas dos pesquisadores é descobrir um método que permita recolher os detritos e reutilizá-los na produção de combustível, já que boa parte é formada por resina oriunda de petróleo o que poderia ter sido feito antes que esse lixo chegasse ao mar.
Porém, como o próprio Moore admite, o grande objetivo é chamar a atenção da comunidade para o problema. "Um dia, esse volume tende a ser tão grande que não ficará mais restrito àquela área".
VÓRTEX
O lixo é mantido no local pelas correntes oceânicas. No Pacífico Norte, com ventos fracos, as correntes tendem a empurrar qualquer material que flutue para o centro, como se fosse um grande redemoinho (também chamado de vórtex).
"Hoje, a ilha de lixo está em águas internacionais, ou seja, em tese, não éde responsabilidade de ninguém. Longe dos olhos da comunidade, ela é como um imenso tapete para baixo do qual empurramos as sobras de nosso consumo, sem falar nos danos que já causa ao meio ambiente".
De acordo com o Programa Ambiental das Nações Unidas, o plástico constitui mais de 70% de todo o lixo flutuante nos oceanos. O estudo avalia, ainda, que cada metro quadrado de oceano contenha mais de 45 mil pedaços de plástico, que acaba funcionando como uma imensa esponja química, concentradora de poluentes. Assim, ao ingerirem pequenos pedaços deplástico, as aves, peixes e mamíferos marinhos absorvem esses resíduos tóxicos, muitos deles cancerígenos.
ORIGEM E DESTINO
Estima-se que um quinto do lixo tenha como origem os navios e as plataformas petrolíferas. Mas a maioria vem mesmo do continente. Uma parte dela, aliás, pode ser encontrada nas praias do Planeta, inclusive aqui na Baixada Santista (veja texto `Lágrimas de sereias').
Na Península Ibérica, por exemplo, dados da campanha 2006/2007 do programa Coastwatch Portugal revelaram a existência de mais de 100 mil resíduos em 350 km de costa. Já outro estudo, feito pela ONU, aponta o Mar Mediterrâneo, nas zonas próximas das costas de Espanha, França e Itália, como a região do Planeta com mais detritos no fundo do mar: 1.935 unidades por quilômetro quadrado.
Na Nova Zelândia, por exemplo, foram verificados depósitos com mais de 100mil fragmentos plástico por metro linear de praia. No litoral da Bahia, um monitoramento indicou a presença de embalagens plásticas oriundas de mais de 60 países, principalmente dos Estados Unidos, Itália e África do Sul.
Segunda-Feira, 17 de Agosto de 2009, 09:18
Lágrimas de sereias nas praias da Região
Da Redação
Antes de atingir o oceano e seguir flutuando até formar as chamadas `ilhasde lixo', os detritos, principalmente plástico, têm como destino às praias.
Aqui mesmo no Litoral paulista é possível encontrar esse tipo de resíduo. Se você olhar atentamente, vai perceber a presença de pequenas bolinhas nas areias das praias de Santos, por exemplo. Elas podem ser brancas, meio amareladas ou mesmo coloridas, tendo entre um e cinco milímetros de diâmetro. Se você já viu essas bolinhas, saiba que elas estão espalhadas pelos oceanos do Planeta, não são naturais e recebem vários nomes: pellets, nibs ou, mais poeticamente,`lagrimas de sereias'.
O que são? Nada mais, nada menos do que resina sintética, em geral polipropileno ou polietileno. É dessa forma, em pellets (bolinhas ou grânulos, em inglês) que a matéria-prima dos produtos plásticos é fabricadanas indústrias químicas. Separados em mais de 40 diferentes tipos, esses grãos são então transportados pelo mundo inteiro.
Quando chegam às fábricas, eles são colocados em máquinas que darão o formato final desejado, tais como copinhos, garrafas, baldes, mamadeiras, isolantes de fiação, réguas, canetas, bolas, seringas, bonecas, enfim, milhares de produtos presentes no nosso cotidiano--um processo que cresceu vertiginosamente a partir do final da 2ª Guerra Mundial, quando os polímeros começaram a ser produzidos em larga escala, provocando uma profunda mudança no cotidiano da humanidade.
SANTOS É ESCOLHIDA
Hoje, os minúsculos pellets são um problema mundial, com vários estudos publicados, principalmente no Japão, Estados Unidos e Europa.
No Brasil, onde há apenas registros esporádicos, cientistas da Universidadede São Paulo (USP) iniciaram no ano passado o primeiro levantamento sistemático desses resíduos nas areias das praias da região.
Em Santos, Cidade escolhida como base para o início da pesquisa, as primeiras coletas indicaram a presença de até 20 mil pellets por metro cúbico de areia em determinados trechos da orla. O número pode impressionar, mas, por enquanto, não há como comparar com outras regiões. "Isso só será possível a partir do final deste ano e ao longo de 2010. Até lá, nosso trabalho tem como objetivo refinar o método de coleta na areia", afirma Alexander Turra, do Instituto de Oceanográfico da USP (IOUSP), coordenador do estudo.
SOLUÇÕES
Essa primeira fase do trabalho, que conta com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), ficará restrita à Baixada Santista. Em seguida, será expandida para todas as praias do Estado, cuja previsão é estar concluída em 2011, com apoio do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Só então, avalia Turra, será possível saber a real distribuição deste micro lixo em todo o Litoral paulista, inclusive identificando as áreas mais impactadas.
"A partir daí, nosso objetivo é conversar com todos os agentes envolvidos e buscar soluções. Hoje, em princípio, é praticamente impossível pensar em recolhê-los das praias. O ideal seria identificar as fontes de origem e agirconjuntamente para minimizar a dispersão dos pellets".
Segunda-Feira, 17 de Agosto de 2009, 09:22
Dez bilhões podem chegar à zona costeira
Da Redação
A pesquisa do IOUSP é a primeira do gênero a ser feita no País com o intuito de mapear e classificar os tipos de resíduos plásticos nas praias.
Outros cientistas, como o oceanógrafo, Frederico Pereira Brandini, da Universidade Federal do Paraná, já haviam, porém, alertado para o problema. Segundo ele, um relatório da agência ambiental norte-americana revelou que os pellets já estão presentes nas areias das praias de todos os oceanos, sem exceção.
"Vamos supor que haja uma perda mínima, irrisória, de 0,001% dessa matéria durante o transporte terrestre e marítimo. Isso representa 10 bilhões de pellets que podem chegar à zona costeira. Mesmo que minhas estimativas sejam exageradas, e que o número seja muito menor, esses resíduos duram de 1 a mais de 10 anos no mar. E é aí que vem o pior", afirma Brandini.No mar, os resíduos plásticos podem ser quase que imperceptíveis ao olho humano, mas são facilmente detectadas pelos animais, como tartarugas, peixes e aves, que as confundem com comida boiando.
"Pesquisas indicam que pelo menos 80 espécies de aves marinhas as ingerem, principalmente o grupo que inclui os albatrozes e petréis. Estudos indicam que eles podem permanecer no trato digestivo das aves entre 10 a 15 meses, ocupando espaço, diminuindo a eficiência alimentar e a absorção de nutrientes, causando enfraquecimento e morte", explica.
A pesquisadora santista Tatiana Neves, coordenado do Projeto Albatroz, confirma o depoimento de Brandini. "Temos não só vários relatos desse tipo de ocorrência como a constatação dessas substâncias nos estômagos e moelas de aves já analisadas".
Esses resíduos seriam a causa da morte de mais de um milhão de aves marinhas todos os anos, bem como de mais de cem mil mamíferos marinhos. Há seis anos, uma baleia Minke foi encontrada morta na Normandia, no norte da França, com 800 quilos de sacolas plásticas no estômago.
Segundo Alexander Turra, para os seres humanos os pellets ou nibs podem causar sérios problemas de saúde se ingeridos. "Eles têm a característica de absorventes, ou seja, se passarem, por exemplo, por uma mancha de óleo, irão agregar partes dessas substâncias a suas superfícies".
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