quinta-feira, 22 de julho de 2010
Amianto
Jim Morris
Do Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo para a BBC*
Giannasi trabalha há 25 anos no combate ao amianto.
Uma brasileira de 52 anos conquistou uma reputação internacional por seu trabalho contra a indústria do amianto no Brasil.
Há 25 anos, Fernanda Giannasi vem tentando banir o produto no país, para evitar que mais pessoas morram em decorrência do seu uso.
Entre os produtores brasileiros de amianto, Giannasi virou até personanon-grata. "Eu não tenho nome. Sou apenas conhecida como 'aquela mulher'", brinca.
Fernanda Giannasi é inspetora do ministério do Trabalho. Ela afirma que o amianto branco – produzido em Goiás e vendido tanto no Brasil quanto no exterior – já matou centenas de pessoas e provocará mais mortes se não for proibido. Ela rejeita a ideia de que o produto possa ser usado com segurança, como defendem alguns produtores. "Isso é uma ficção", diz Fernanda.
*Dois tumores*
Por seu trabalho no Brasil, ela ganhou vários admiradores na comunidade internacional. Um médico de Goiás apelidou-a de "Erin Brockovich brasileira", em referência à americana que lutou contra indústrias que poluíam a água na Califórnia e virou personagem de um filme.
O palco do trabalho de Fernanda Giannasi são as cidades brasileiras, como Osasco, em São Paulo.
Eliezer João de Souza trabalhou em uma fábrica no local entre 1968 e 1981, cortando amianto. "A fábrica era cheia de pó por toda a parte. Era possível ver o pó nos raios de sol", conta Souza, hoje com 68 anos. Até 1977, os trabalhadores não tinham nenhum equipamento especial. Naquele ano, eles receberam máscaras de papel. "Em um momento, eles chamaram todos os trabalhadores e tiraram raio-X dos nossos pulmões, mas eles nunca nos mostraram os resultados."
Fernanda Giannasi tornou-se conhecida internacionalmente.
Em 2000, Eliezer Souza passou por uma cirurgia para remover dois tumores do seu pulmão. O trabalhador é um dos integrantes da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA). O grupo é um dos 70 que foram formados pelo mundo reunindo vítimas da substância. O amianto já foi amplamente usado em vários países, mas isso mudou ao longo dos últimos anos. No mundo todo, 52 países já proibiram ou restringiram o uso do amianto. A União Europeia proíbe qualquer variação do amianto. Nos Estados Unidos, apenas alguns freios são usados. Em países em desenvolvimento como China, Índia e Brasil, no entanto, a substância ainda é usada. O Brasil é o terceiro maior produtor e exportador de amianto, que é vendido para países como Colômbia e México. O país também é o quinto maior consumidor do produto. As 11 empresas que trabalham com o produto empregam mais de 3,5 mil pessoasdiretamente e movimentam R$ 2,5 bilhões por ano.
*Ativista*
Giannasi começou sua carreira nos anos 80 no Brasil, combatendo a indústria do amianto em São Paulo. Em 1991, após vasta experiência como inspetora, ela foi transferida para Osasco, cidade que concentra as maiores indústrias do setor. Em 1995, ela entrou em guerra contra uma empresa local, tentando impedir a demolição de uma das fábricas sem um manejo ambiental. O processo poderia liberar ainda mais partículas de amianto no ar. Desde o começo do governo Lula, em 2003, a produção de amianto cresceu no Brasil. Fernanda Giannasi levantou a voz para protestar contra a falta de regulação e acabou suspensa por 45 dias. Depois de ir à imprensa, ela conseguiu voltar ao cargo. Exausta da luta de quase três décadas, ela diz hoje que não acredita que conseguirá alcançar seu objetivo maior: uma proibição nacional do uso do amianto no Brasil.
** Colaborou Marcelo Soares.
Confira a Clique reportagem completa
do Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo (em inglês).*
Amianto pode matar mais de 1 milhão no mundo até 2030
Canadá exporta amianto das suas minas, mas proíbe uso do produto. Especialistas em saúde pública alertam para um grande aumento no número de mortes nas próximas duas décadas devido ao uso do amianto pela indústria da construção civil, sobretudo nos países em desenvolvimento.
Uma investigação conjunta da BBC e do Consórcio de Jornalistas Investigativos revelou que mais de 1 milhão de pessoas podem morrer até 2030 devido a doenças ligadas à substância.
Com um consumo de amianto 50 vezes maior do que os Estados Unidos, o Brasil é o quinto maior consumidor do produto em uma lista liderada por China, Índia e Rússia.
O amianto é uma fibra natural presente em minas. Barato e resistente ao calor e ao fogo, é misturado ao cimento para construção de telhas e pisos. No entanto, a substância, cujo uso é proibido ou restrito em 52 países, solta fragmentos microscópicos no ar que podem provocar diversas doenças pulmonares quando inaladas, inclusive alguns tipos de câncer.
*Amianto branco*
A investigação conjunta do Consórcio de Jornalistas Investigativos e da BB Crevelou que a produção de amianto continua na ordem de dois milhões de toneladas.
A indústria do amianto movimenta bilhões de dólares, sobretudo com exportações para países em desenvolvimento, onde as leis de proteção e a fiscalização são mais brandas.
Apesar da proibição e restrição ao uso, uma variação da substância conhecida como amianto branco é produzida e exportada para diversos países.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), mesmo o amianto branco pode provocar câncer. Alguns cientistas temem que a disseminação do amianto branco possa prolongar uma epidemia de doenças relacionadas à substância. "Minha visão é de que os riscos são extremamente altos. Eles são tão altos quanto qualquer outra substância cancerígena que vimos, com exceção, talvez, do cigarro", afirma Vincent Cogliano, cientista da Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer da OMS.
Segundo a OMS, 125 milhões de pessoas convivem com amianto no trabalho. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que 100 mil trabalhadores morram por ano devido a doenças relacionadas ao amianto. Nos Estados Unidos, a indústria da construção civil não usa mais nenhum tipo de amianto. No entanto, o número de mortes devido à substância está chegando ao ápice, devido ao longo período em que a doença ainda pode se manifestar. No México, mais de 2 mil empresas usam o amianto em diversos produtos, como freios, aquecedores, tetos, canos e cabos. Mais de 8 mil trabalhadores têm contato direto com a substância.
*Doença*
O Canadá é um dos maiores produtores mundiais de amianto branco e exporta o produto, mas proíbe seu uso no país. Na província de Quebec, Bernard Coulombe, que é proprietário de uma mina, afirma que o amianto branco exportado por ele é vendido "exclusivamente para consumidores finais que possuem os mesmos padrões de higiene industrial do Canadá". Ele afirma que sua indústria possui amparo legal para exportar o produto. Não muito longe dali, a pintora amadora Janice Tomkins luta contra mesotelioma, uma doença rara ligada ao amianto. Ela acredita ter contraído a doença há vários anos devido à exposição ao amianto azul e marrom, variações hoje proibidas internacionalmente. Ela luta para impedir que o governo do Quebec libere um financiamento de US$56 milhões para que a mina próxima a sua casa possa expandir a produção, de olho em mercados emergentes como a Índia.
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